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Quatro décadas de sustentabilidade do etanol

Por João Guilherme Sabino Ometto*

Apesar das recentes polêmicas sobre a Amazônia e algumas posições de nosso governo quanto a temas ambientais, o Brasil terá muito o que mostrar na Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas (COP 25), de 2 a 13 de dezembro, em Madri. Coincidentemente, os biocombustíveis, protagonistas de algumas de nossas principais conquistas na luta contra o aquecimento da Terra, são objeto de duas comemorações importantes: a criação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), em 14 de novembro de 1975, há 44 anos; e o 40º aniversário (19 de setembro) da assinatura do protocolo que viabilizou a produção dos carros movidos a etanol, firmado entre a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e o Ministério da Indústria e Comércio.

O Proálcool, criado para que nosso país fizesse frente à crise internacional do petróleo nos anos de 1970, tornou-se um dos principais responsáveis por nossa capacidade de atender aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na área ambiental. O esforço conjunto do setor sucroalcooleiro, organismos governamentais, instituições de pesquisa e indústria automotiva permitiu que o Brasil produzisse em escala um combustível mais limpo e renovável, aliado à tecnologia dos carros flex, apresentando uma solução concreta no combate às mudanças climáticas.

Nesse sentido, é gratificante lembrar o esforço que fizemos, envolvendo muitas pessoas com visão de futuro, para viabilizar uma tecnologia revolucionária nos setores industrial e energético: nos anos de 1970, quando presidi a Sociedade dos Técnicos Açucareiros e Alcooleiros do Brasil (STAB), formamos uma comissão, junto com outros dirigentes setoriais, para visitar centros de pesquisa empenhados no desenvolvimento do carro a álcool. Não havia no País capacitação para a produção de motores, fabricados no exterior, sendo apenas montados aqui. Por isso, foi necessário gerar know-how próprio.

Estavam engajados nesse processo, o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), em São José dos Campos, já avançadíssimo à época, e a Escola da USP, campus de São Carlos, onde eu havia me formado. Nas fábricas da Volkswagen, GM e Willys-Ford, um contingente de engenheiros, com equipamentos de última geração, estava igualmente mobilizado.

Nasciam, assim, os veículos a álcool brasileiros. A criatividade nacional também era demonstrada nas adaptações feitas pelos mecânicos, nas retíficas. Os caminhões das usinas do Nordeste e São Paulo tinham os motores convertidos. Aliás, essa capacidade de nossa gente de encontrar soluções já havia sido demonstrada na Segunda Guerra, quando faltou combustível. Lembro que meu pai tinha um carro a gasogênio, mas que subia a Serra do Mar utilizando álcool. O Proálcool foi um decisivo passo para o desenvolvimento da engenharia de motores no Brasil.

É graças a todo esse esforço que, na COP 25, poderemos demonstrar o quanto estamos avançados em algumas metas para 2030 do Acordo de Paris: do aumento previsto de 18% da participação de biocombustíveis (Renovabio), realizamos 17,4% e já superamos em 0,3 ponto percentual o compromisso de 45% dos renováveis na matriz energética nacional, que se tornou a mais limpa e diversificada do mundo.

Estudos do Brasil e do Exterior não deixam dúvidas de que o etanol reduz a emissão de dióxido de carbono em relação à gasolina. Quando produzido a partir da cana-de-açúcar, como no País, o resultado é ainda maior, pois os canaviais sequestram carbono na atmosfera em volume mais elevado do que o emitido na queima do combustível. A utilização do álcool nos veículos apresenta outra vantagem a ser lembrada: sua adição à gasolina, considerando sua capacidade de aumentar a octanagem, permitiu extinguir, nos anos 90, o poluente chumbo tetraetila como aditivo do combustível brasileiro.

Ao lembrarmos toda essa trajetória, devemos comemorar o fato de o Brasil ter quebrado o recorde de produção, consumo e venda de etanol na safra 2018/2019. Tal resultado mostra que nossa matriz energética pode ser cada vez mais limpa e renovável, alimentada por um combustível sustentável e cuja produção gera emprego, renda e investimentos, contribuindo, ainda, para que o Brasil cumpra seus compromissos com o Planeta.

*João Guilherme Sabino Ometto, engenheiro (Escola de Engenharia de São Carlos – EESC/USP), é vice-presidente do Conselho de Administração da Usina São Martinho e membro da Academia Nacional de Agricultura (ANA).

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