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Como o avanço das pesquisas sobre os microrganismos identificou uma nova ferramenta agrícola

Mesmo com um conhecimento da diversidade de microrganismos muito limitado e heterogêneo, estima-se que 97% de todos os microrganismos conhecidos sejam benéficos a outros organismos. Nesse sentido, o avanço das pesquisas tem proporcionado o desenvolvimento de novas ferramentas e reforçado o potencial econômico dos microrganismos para a agricultura.

O microbioma como biosensor

O uso dos microrganismos benéficos do solo vem ganhando cada vez mais espaço na agricultura atual. Só para citar alguns exemplos: hoje já se usa bactérias fixadoras de nitrogênio para ajudar na nutrição agrícola. Já os fungos entomopatogênicos são utilizados no controle biológico de pragas.

Visando expandir ainda mais esse potencial microbiota do solo na agricultura, os pesquisadores Avihai Zolti, Stefan J. Green, Noa Sela, Yitzhak Hadar e Dror Minz realizaram o estudo The microbiome as a biosensor: functional profiles elucidate hidden stress in hosts.

As pesquisas foram conduzidas em Israel, na estação de pesquisa agrícola Kiryat-Gat-Lachish, para avaliar o potencial uso das rizobactérias, que são aqueles microrganismos associados as raízes da planta, como biosensores.

Os cientistas partiram da hipótese de que os microrganismos associados às raízes das plantas podem ser usados como biosensores in situ de condições ambientais adversas, como o:

  • Estresse salino;
  • Estresse anoxítico (baixa disponibilidade de oxigênio);
  • Estresse de pH.

O estudo foi motivado por ainda ser muito difícil identificar a resposta individual da planta ao estresse pela expressão gênica, sob condições controladas.

Já a escolha das rizobactérias como objeto de estudo foi motivada pela capacidade de elas serem altamente responsivas aos estímulos ambientais, alterando a sua estrutura e atividade em resposta às mudanças das condições.

Para estudar essa resposta, foram usadas duas espécies de plantas com diferentes níveis de informações genéticas (tomate e alface) em condições de campo semi-controladas.

A fim de induzir os diferentes tipos de estresse, os cientistas utilizaram a irrigação com água de baixa qualidade, buscando alterar os parâmetros de pH, matéria orgânica dissolvida (DOC) e condutividade elétrica (CE) do solo.

Foram realizadas análises de DNA para examinar as respostas da microbiota sob as condições de estresse. Nessas análises, foi percebido que a grande maioria dos genes anotados era derivada de bactérias (96,7%), enquanto a porcentagem de leituras derivadas de fungos (1,2%), archaea (0,5%) e vírus (0,13%) foi muito menor. 

Relação do efeito do tipo de planta e do tratamento de irrigação no metagenoma dos microrganismos, sendo a água de baixa qualidade (TWW) representada no anel externo

Os resultados mostraram que, nas plantas irrigadas com água de baixa qualidade, os microrganismos expressaram genes que se correlacionavam diretamente aos altos níveis de sais, elevado pH e níveis baixos de oxigênio encontrados no solo.

Dessa forma, os pesquisadores concluíram que os microrganismos associados às raízes da planta podem ser usados como uma ferramenta preditiva para identificar estresses abióticos, pela sua capacidade responsiva de curto e longo prazo à essas condições.  

Essa nova descoberta pode ajudar a ampliar ainda mais o escopo de uso dos microrganismos benéficos do solo. Mas, o que permitiu que hoje se tenha mais conhecimento sobre esses seres tão importantes para a agricultura?

A evolução das pesquisas sobre microrganismos

A evolução das técnicas moleculares e de bioinformática estão entre os principais fatores que impulsionaram o crescimento das pesquisas sobre microrganismos nos últimos anos.

Elas permitiram a mudança do foco das análises de isolados microbianos ou ecossistemas de baixa diversidade para a análise de ambientes com comunidades microbianas altamente diversas.

Com isso, recentemente foi observado o maior progresso no número de estudos relacionados a microbiota do solo e suas funções, que se mostrou praticamente 13 vezes maior que no início dos anos 90.

O número de pesquisas relacionadas aos microrganismos do solo e suas funções cresceu exponencialmente, fato este evidenciado pelo volume de artigos publicados no Google Scholar nos últimos anos. 

O aumento do número de pesquisas também permitiu o aumento do conhecimento acerca dos microrganismos. O catálago Genomes from Earth’s Microbiomes (GEM), publicado na revista Nature Biotecnology, hoje já conta com um repositório público de mais de 50 mil genomas de microrganismos.

O catálogo GEM foi um trabalho liderado pelo Joint Genome Institute (JGI) do Departamento de Energia (DOE) dos Estados Unidos, que envolveu mais de 200 cientistas na varredura de um dos maiores banco de dados de sequenciamento genético em busca de genomas completos de organismos.   

O catálogo GEM conta com cerca de 12 mil genomas de espécies provavelmente inéditas de fungos, bactérias e arqueas. Na representação da árvore filogenética acima, as ramificações em verde indicam novas linhagens exclusivas do catálogo GEM.
(Fonte: Nayfach, S., Roux, S., Seshadri, R. et al, 2021)  

Apesar do grande avanço conquistado com os diversos trabalhos e pesquisas, o caminho para o conhecimento da total biodiversidade microrganismos ainda é longo, uma vez que se estima que sejam conhecidos:

  • Bactérias e vírus: menos de 1%;
  • Fungos: menos de 5%;
  • Protozoários: cerca de 10%.

Tendo em vista esse cenário, anualmente bilhões de dólares estão sendo investidos em biotecnologia e bioinformática e novas empresas altamente tecnológicas vem sendo fundadas com o objetivo de valorizar e aprimorar o uso de microrganismos do solo.

Tais investimentos são justificados pelo grande potencial econômico de grande parte desses seres microscópicos. Eles estão permitindo o desenvolvimento de novas tecnologias que vão desde os produtos biológicos ao uso da microbiota do solo como uma ferramenta no combate às mudanças climáticas.

Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Controle Biológico (ABCBio), somente os produtos de controle biológico aprovados pelo Mapa, movimentaram em 2019 cerca de R$ 464,5 milhões de reais.

Além disso, os dois últimos campeões do concurso nacional de máxima produtividade da soja avaliado pelo Comitê Estratégico Soja Brasil (CESB), alcançaram mais de 115 sacas de soja por hectare usando como uma das ferramentas o controle biológico com microrganismos em pelo menos um dos estádios de crescimento da cultura.

Se a ciência está descobrindo cada vez mais benefícios da microbiota do solo, como preservá-la?

Como preservar os microrganismos do solo  

Proporcionar condições adequadas para o desenvolvimento dos microrganismos do solo é uma das formas mais efetivas de preservar os microrganismos do solo. Para isso, é importante entender os principais fatores que influenciar na diversidade dessas comunidades, como:

  • Localização geográfica;
  • Estádio de desenvolvimento da planta;
  • Disponibilidade de nutrientes e oxigênio;
  • Potencial eletroquímico do solo;
  • Práticas agrícolas.

Nesse sentido, manter a cobertura vegetal do solo durante todo o ano, aumentar a diversidade de plantas na sua lavoura e utilizar fertilizantes com baixo índice salino e liberação progressiva de nutrientes são apenas algumas práticas que podem impulsionar a microbiota do seu agroecossistema.

Além disso, é importante ressaltar que a inoculação de microrganismos por si só não garante bons resultados a campo e é preciso adotar práticas que complementem essa técnica, como explicam o professor da UNESP Carlos Alexandre Costa Crusciol e o pesquisador de cana de açúcar Luiz Antônio Paiva:

Assim, entender e preservar a microbiota do solo é a chave para as descobertas de ferramentas que possibilitem uma agricultura mais sustentável e com melhores resultados!

Fonte: Stella Xavier

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